quarta-feira, 26 de setembro de 2007

MOTORISTA

Na faixa de pedestres
São listras em todo o caminho
Será que o motorista só vê listras em seu caminho?

DEMOCRACIA NO VARAL

Pra que se preocupar tanto com a democracia
Se da janela do vizinho
Não se houve um bom dia

Se na portaria do prédio
Só se fala fiado
Só se come pão amassado
Só se fia o todo dia

ESCONDERIJO

O que se esconde nas frestas do tempo
Dos tempos idos
Dos futuros vindos?
É melhor gritar baixinho
Sussurar o tempo
Consumí-lo
A cada segundo

O MICROMULTIPROCESSADOR DE FRUTAS TAMBÉM ASSUSTA

Só Kant vagou na sua imobilização
Porque navegar é preciso.

TERRORISMO POÉTICO

Errar as palavras, criar uma outra ortografia,
Varrer o stabilishment
E lavar toda a hipocrisia

E o Marx, e o Hegel e o Nietzsche?
O quê fazer com toda essa gente
Pra poder conviver com a gente
Como a gente?
Esquentar a panela da sabedoria
Pra dividir o quinhão
Eis a nossa lição!

Como é bom quando nos libertamos de papéis viciados
Ou impostos
Quando a vida fala mais alto
E rasga a máscara que cresce

Que devaneio não libera adrenalina
Que combustão não assusta
Até a arte que cospe na cara também cutuca

DEVANEIOS IV

E o Kafka que estava ali?
Por que tem que ser tão atual?
O bate cartão de todo dia
Ainda prende muita gente todo dia.

OS PASSOS

Já se foram os trinta passos dados na contramão
Já se foram muitos passos em qualquer direção
E agora?
Onde ir?
Mas porque toda essa preocupação,
Apenas seguir ...

OS QUERERES

Mal-me-quer
Bem-me-quer
Mal-me-quer
Bem-me-quer
Onde foi que eu cai?
Pluft!

EPIFANIA

O homem suporta a fome, o homem suporta a paixão, tudo isso sem ser derrubado, sem ser abalado ... mentirra deslavada, manteiga derretida, opaco púlpito de cães adestrados!

INDIGNA CONDIÇÃO

Miséria, fome, difamação
de que mais suporta o homem ou a mulher?
No caso da mulher algumas violências a mais
Um cartaz na esquina, em qualquer ponto de café, na cervejinha do fim do dia
Se chegar a ligar aquela telinha iluminada, a invasão é ainda maior
Estamos no século XXI, onde estações espaciais fazem passeios com transportes de passageiros
Engenharia genética saltando da transgenia nos alimentos direto para os seres humanos
Tempos de testes de teletransporte cada vez mais avançados
Será que ainda somos mesmo humanos, ou clones com amnésia?
Sem apologia à tecnologia, dou de cara com a miséria humana no cartaz da esquina
Onde, ao invés da alteridade, encontro o ser feminino,
Imagem do meu ser, na prateleira capitalista
Até quando?

Despedida

E o afeto da despedida se despediu de despedida
se esvaiu da medida
se exortou e se exauriu, sumiu
O sumidouro do mundo na corrente de pensamentos, acontecimentos
marcam a roda do mundo, a roda da vida, a roda que gira, gira ...

DEVANEIOS III

Nas sequências dos tempos
limites afora
Afora dos tempos
Vagam pelas sombras assombrosas das nossas almas inconfidentes
de trapos vivos ausentes
Anciosos de descoberta de esperança de uma vida decente
Famigerados e famintos do mundo num mundo famigerado e faminto
Que a guerra do Iraque não é aqui
Que a seca do nordeste não é aqui
Que Hiroshima não é aqui
Aqui os fantasmas tem outros nomes
Se vestem bem e nos roubam todo dia
Noite e dia!
Noite e dia!

DEVANEIO II

Acabou o êxtase
E o Hegel espera no fogão
O Calheiros se safou, mas eu não me safo

E o jardim das Hortências
Não deixam de crescer

E a primavera chegou trazendo novas

De tudo o que há na terra, você há de comer
Dizia o Leão

É primavera nos dentes?!?
Para ursos e piratas
E ladrões de açaí

Transeuntes

Tenho pensado nos corpos
Em sua repressão e abertura
Em seus movimentos oscilantes,
andantes transeuntes
Passageiros de alma
Ou alma de passageiros
Quantas coisas estão nele contidas?
Qual o seu potencial de autonomia, construção, repetição?
São todos sujeitos corpóreos
Ou corpos de sujeitos
Passagem de corpos
Corpos de passagem